domingo, 27 de fevereiro de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.

312 A conversão de Constantino


Era o mês de outubro do ano 312. 

Um jovem general, a quem todas as tropas romanas da Bretanha e da Gália eram fiéis, marchava em direção a Roma para desafiar Maxêncio, outro postulante ao trono imperial. 

Segundo o relato da história, o general Constantino olhou para o céu e viu um sinal, uma cruz brilhante, na qual podia ler: “Com isto vencerás”. 

O supersticioso soldado já estava começando a rejeitar as divindades romanas a favor de um único Deus. Seu pai adorava o supremo deus Sol. 
Seria um bom presságio daquele Deus na véspera da batalha?

Mais tarde, Cristo teria aparecido a Constantino em um sonho, segurando o mesmo sinal (uma cruz inclinada), lembrando as letras gregas chi () e rho (), as duas primeiras letras da palavra Cristos. 

O general foi instruído a colocar esse sinal nos escudos de seus soldados, o que fez prontamente, da forma exata como fora ordenado.

Conforme prometido, Constantino venceu a batalha.

Esse foi um dos diversos momentos marcantes do século iv, um período de violentas mudanças. 

Se você tivesse saído de Roma no ano 305 d.C. 
para viver anos no deserto, quando voltasse certamente esperaria encontrar o cristianismo morto ou enfrentando as últimas ondas de perseguição. 

Em vez disso, o cristianismo se tornou a religião patrocinada pelo império.

Depois de ter tomado o poder em 284, Diocleciano, um dos mais brilhantes imperadores romanos, começou uma enorme reorganização que afetaria as áreas militar, econômica e civil. 

Durante certo período de tempo, ele deixou o cristianismo em paz.

Uma das grandes ideias de Diocleciano foi a reestruturação do poder imperial. 

Dividiu o império em Oriente e Ocidente, e cada lado teria um imperador e um vice imperador (ou césar). 

Cada imperador serviria por vinte anos e, a seguir, os césares assumiriam também por vinte anos e assim por diante. 

No ano 286, Diocleciano indicou Maximiano imperador do Ocidente, enquanto ele mesmo continuava a governar o Oriente. 

Os césares eram Constâncio Cloro (pai de Constantino) no Ocidente e Valério no Oriente.

Valério era radicalmente anticristão (há informações que ele atribuiu a perda de uma batalha a um soldado cristão que fez o sinal da cruz). 

É bem provável que o imperador do Oriente tenha assumido posições anticristãs por instigação de Valério. 

Tudo isso era parte da reorganização do império, de modo que a lógica era a seguinte: Roma tinha uma moeda única, uni sistema político único e, portanto, deveria ter uma única religião; os cristãos, porém, estavam em seu caminho.

A partir do ano 298, os cristãos foram retirados do exército e do serviço civil. 

Em 303, a grande perseguição teve início. 

As autoridades planejaram impor severas sanções sobre os cristãos, que começariam a ser implantadas na Festa da Terminá-la, em 23 de fevereiro. 

As igrejas foram arrasadas, as Escrituras confiscadas, e as reuniões proibidas. 

No início, não houve derramamento de sangue, mas Valério logo se encarregou de mudar essa situação. 

Quando Diocleciano e Maximiano deixaram seus postos (de acordo com o planejado), em 305, Valério desencadeou uma perseguição ainda mais brutal. 

De modo geral, Constantino, que governava o Ocidente, era mais indulgente. 

Porém, as histórias de horror do Oriente eram abundantes. 

Até o ano 310, a perseguição tirou a vida de muitos cristãos.

Contudo, Galério foi incapaz de esmagar a igreja. 
Estranhamente, em seu leito de morte, ele mudou de idéia. 

Em outro grande momento, no dia 30 de abril de 31 1, o feroz imperador desistiu de lutar contra o cristianismo e promulgou o Édito de Tolerância. 

Sempre político, insistiu em que fizera tudo para o bem do império, mas que “grande número” de cristãos “persiste em sua determinação”. 

Desse modo, agora era melhor permitir que eles se encontrassem livremente, contanto que não atentassem contra a ordem pública. 

Além disso, declarou: “Será tarefa deles orar ao seu Deus em benefício de nosso Estado”. 

Roma precisava de toda a ajuda que pudesse obter. Valério morreu seis dias depois.

O grande plano de Diocleciano, no entanto, começava a ruir. 

Quando Constâncio morreu, no ano 306, seu filho Constantino foi proclamado governador por seus soldados leais. 

Maximiano, porém, tentou sair do exílio e governar o Ocidente outra vez com o filho, Maxêncio (que terminou tirando o próprio pai do poder). 

Enquanto isso, Valério indicava um general de sua confiança, Licínio, para governar o Ocidente. Cada um desses futuros imperadores reivindicava um pedaço do território ocidental. 

Eles teriam de lutar por ele. Constantino, de maneira astuta, forjou uma aliança com Licínio e lutou contra Maxêncio. 

Na batalha da Ponte Mílvia, Constantino saiu vitorioso.

Naquele momento, Constantino e Licínio montaram um delicado equilíbrio de poder. 

Constantino estava ansioso para agradecer a Cristo por sua vitória e, desse modo, optou por dar liberdade e status à igreja. 

No ano 313, ele e Licínio emitiram oficialmente o Edito de Milão, garantindo a liberdade religiosa dentro do império. “Nosso propósito”, dizia o édito, “é garantir tanto aos cristãos quanto a todos os outros a plena autoridade de seguir qualquer culto que o homem desejar”.

Constantino, imediatamente, assumiu o interesse imperial pela igreja: restaurou suas propriedades, deu-lhe dinheiro, interveio na controvérsia donatista e convocou os concílios eclesiásticos de Arles e de Nicéia. 

Ele também fazia manobras para obter poder sobre Licínio, a quem finalmente depôs, em 324.

Assim, a igreja passou de perseguida a privilegiada. 

Em um período de tempo surpreendentemente curto, suas perspectivas mudaram por completo. 

Depois de séculos como movimento contracultura, a igreja precisava aprender a lidar com o poder. 
Ela não fez todas as coisas de maneira correta. 

A própria presença dinâmica de Constantino modelou a igreja do século iv, modelo que ela adotou daí em diante. Ele era um mestre do poder e da política, e a igreja aprendeu a usar essas ferramentas.

A visão de Constantino foi autêntica ou ele foi apenas um oportunista, que usou o cristianismo para benefício próprio? Somente Deus conhece a alma. 

Embora tenha falhado na demonstração de sua fé em várias ocasiões, o imperador certamente assumiu um interesse ativo no cristianismo que professava, chegou até mesmo a correr risco pessoal em certos momentos.

Ε certo que Deus usou Constantino para fazer com que as coisas acontecessem para a igreja. 

O imperador afirmou e assegurou a tolerância oficial à fé. 

Ao fazer isso, porém, ele seguiu os passos do moribundo Valério. 

Assim, a batalha contra a perseguição romana foi vencida, em certo sentido, não na ponte Mílvia, mas nas arenas em que os cristãos entraram para enfrentar bravamente a morte.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.!

270 Antão começa sua vida de eremita

Um dos principais fundadores das comunidades monásticas não tinha em mente a idéia de fundar coisa alguma. 

Ele estava simplesmente preocupado com a própria condição espiritual e passou a maior parte de sua vida sozinho.

Antão [ou Antônio] nasceu no Egito, provavelmente por volta do ano 250, em uma família de pais abastados que morreram quando contava cerca de vinte anos, deixando para ele toda sua herança. 

As palavras de Jesus ao jovem rico — “Se você quer ser perfeito, vá, venda os seus bens e dê o dinheiro aos pobres” — mudaram a vida do jovem Antão. 

A mensagem parecia ter sido direcionada a ele, uma vez que a entendeu literalmente. 

Doou suas terras aos vizinhos, vendeu suas outras propriedades e repartiu o dinheiro entre os pobres. 

Colocou-se sob os cuidados de um cristão idoso que lhe ensinou as alegrias da autonegação. 

Antão optou por comer uma única refeição por dia, composta de pão e água, e passou a dormir no chão.

Com a conversão do imperador Constantino em 312, a situação da igreja mudou drasticamente. 

Os cristãos saíram da posição de minoria perseguida e tornaram-se membros de uma religião respeitável que desfrutava apoio oficial. 

Contudo, à medida que grandes multidões começaram a entrar na igreja, ficou mais difícil distinguir entre os que tinham compromisso verdadeiro com Cristo e os que queriam apenas tomar parte da religião popular. 

A fé se transformou em uma coisa fácil e a sinceridade foi prejudicada.

Cristãos zelosos dessa época, com frequência, optavam por lutar contra o comprometimento de sua fé afastando-se do mundo. 

Antão buscou fazer isso e foi viver em uma caverna. 

De acordo com Atanásio, seu biógrafo, durante doze anos Antão foi cercado por demônios que assumiam formas de vários animais estranhos e que, em alguns momentos, o atacavam, e, em determinada ocasião, quase o mataram. 

Eles estavam tentando trazer Antão de volta ao mundo dos prazeres sensuais, mas Antão sempre se levantava de maneira triunfante.

Para se afastar ainda mais do mundo, Antão se mudou para um forte abandonado, onde viveu vinte anos sem ver rosto humano. 

Sua comida lhe era jogada por cima do muro. 

As pessoas ouviam sobre sua impressionante autonegação e suas batalhas com os demônios. 

Alguns admiradores ergueram casas rudes próximas ao forte, e, de modo relutante, ele se tornou conselheiro espiritual delas, dando-lhes orientação sobre jejum, oração e obras de caridade. 

Antão certamente se tornou um modelo de autonegação.

O eremita não conseguiu se desligar totalmente do mundo. 

Em 311, Maximiano, um dos últimos imperadores pagãos, estava perseguindo os cristãos, o que fez com que Antão deixasse sua casa, disposto até mesmo a morrer por sua fé. 

Em vez disso, ele ministrou aos cristãos que foram condenados a trabalhar nas minas imperiais. 
Essa experiência o convenceu de que viver a vida cristã poderia ser algo tão santo quanto morrer por ela. 

Mais uma vez, em 350, ele saiu de casa para defender a ortodoxia contra a heresia ariana, que não fora extinta pelo Concilio de Nicéia (325).

Muitas pessoas, incluindo o imperador Constantino, buscavam o conselho espiritual do eremita.

Antão morreu com 105 anos, aparentemente desfrutando vigor físico e mental. 

Ele insistiu para que fosse enterrado secretamente de modo que nenhum culto se desenvolvesse ao redor de sua sepultura.

Apesar desse cuidado, porém, um culto surgiu. 

Atanásio, o influente teólogo que teve papel muito importante no Concilio de Nicéia, escreveu uma obra muito popular chamada Vida de Antão, na qual retratava-o como o monge ideal, que podia realizar milagres e discernir entre espíritos bons e maus. 

Não demorou muito para que a idéia de um verdadeiro guerreiro espiritual que se tornou monge e negou a si mesmo tomasse vulto dentro da igreja.

A prática das comunidades de monges que viviam juntos começou com Pacóvio, um jovem companheiro de Antão. 

Como o austero e individualista Antão, a maioria de seus seguidores também foi eremita. 

Seja como for, Antão comunicou a idéia de que pessoa verdadeiramente religiosa se afasta do mundo, abstendo-se do casamento, da família e dos prazeres mundanos.

Essa idéia só foi desafiada seriamente na época da Reforma.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.!

251 Cipriano escreve Unidade da igreja!


Que relação existe entre os membros da igreja e seus líderes? De que maneira a igreja pode disciplinar os membros? 

Essas são questões que a igreja deve abordar em qualquer época.

Em meados do século m, as respostas a essas perguntas foram proferidas por Cipriano, que possuíra muita riqueza e nascera pagão em uma família culta, por volta do ano 200. 

Quando se tornou cristão, renunciou ao seu estilo de vida, doou seus bens e o dinheiro aos pobres e assumiu o voto de castidade. 

Com relação à sua conversão, escreveu: “O segundo nascimento fez de mim um novo homem por meio do Espírito soprado do céu”.

Professor de retórica e orador famoso, o eloquente e devoto Cipriano destacou-se entre os membros da igreja, tornando-se bispo de Cartago por volta do ano 248.

Embora tivesse conhecimento dos clássicos gregos e romanos, Cipriano não era teólogo. 

De modo diferente de Tertuliano, a quem admirava, Cipriano era um homem prático que se importava pouco com as disputas teológicas de seus dias. 

Ele simplesmente queria a unidade da igreja. 

Em uma igreja bem desunida, buscou unir os cristãos por meio da autoridade dos bispos.

O imperador romano Décio perseguira os cristãos, e alguns negaram sua fé. 

Décio não procurava fazer mártires, porque sabia que o martírio simplesmente chamava mais a atenção para o cristianismo. 

Em vez de matar os cristãos, os torturava, na esperança de que dissessem “César é Senhor”. 

Os que se rendiam e proferiam essa declaração passaram a ser conhecidos como lápis.

Os cristãos que se mantinham firmes, denominados “confessores”, normalmente desaprovavam os lápis. 

Desse modo, o concilio de bispos estabeleceu regras rígidas em relação à readmissão dos crentes proscritos na igreja. 

Diante dessa disciplina, um sacerdote chamado Novato deu início a uma igreja rival que oferecia admissão fácil aos lápis.

Embora não tivesse sofrido por causa de sua fé, Cipriano não conseguia suportar a divisão. 

Acreditava que os cristãos dedicados deveriam passar pela penitência para provar sua fé. 

A penitência era composta de um período de tristeza verdadeira, depois do qual a pessoa poderia participar novamente da ceia do Senhor. 

Depois de o penitente ter “cumprido seu tempo”, ele comparecia diante da congregação vestido de saco e coberto de cinzas para que os bispos pronunciassem o perdão. 

Cipriano via isso como um sistema graduado: quanto mais grave fosse o pecado, mais penitência a pessoa precisava cumprir. 

Sua idéia tornou-se popular e passou a ser um dos mais poderosos — e, às vezes, mais abusivos — métodos de disciplina da igreja.

No ano 251, Cipriano convocou o Concilio de Cartago e leu Unidade da igreja, seu trabalho principal, que teve profunda influência sobre a história da igreja. 

A igreja, conforme argumentou, é uma instituição divina — a noiva de Cristo — e somente pode haver uma noiva. 

Somente na igreja as pessoas poderiam alcançar a salvação; fora dela, há somente escuridão e confusão. 

Fora da igreja, os sacramentos e os pastores — e até mesmo a Bíblia — não tinham importância. 

O indivíduo não poderia viver a vida cristã em contato direto com Deus; ele precisava da igreja. 

Uma vez que Cristo estabelecera a igreja sob autoridade de Pedro, a Pedra, Cipriano disse que todos os bispos eram, em certo sentido, sucessores de Pedro e, portanto, deveriam ser obedecidos. 

Embora não declarasse que o bispo de Roma estava acima dos outros, Cipriano via o episcopado como especial em razão da conexão de Pedro àquela cidade.

Afirmações de Cipriano como “Fora da igreja não há salvação” e “Ninguém pode ter Deus como Pai se não tiver a igreja como mãe” encorajavam as pessoas a dar aos bispos lugar de grande importância. 

O bispo era capaz de determinar quem podia fazer parte da igreja, o que, com efeito, é o mesmo que ter o poder de dizer: “Você está salvo; você não está salvo”. 

Em vez de confiar na obra do Espírito Santo por meio da igreja como um todo, Cipriano deixou implícito que o Espírito Santo trabalhava por meio dos bispos.

Os bispos, naturalmente, ganharam poder com a disseminação dessas ideias. 

Cipriano também promoveu a idéia de que a missa era o sacrifício do sangue e do corpo de Cristo. 

Uma vez que os sacerdotes agiam como representantes de Cristo, oferecendo novamente o sacrifício em todos os cultos de adoração, isso somente serviu para lhes aumentar o poder.

Cipriano morreu durante a perseguição do imperador Valeriano. 

Pelo fato de ter se recusado a oferecer sacrifícios aos deuses pagãos, o bispo de Cartago foi decapitado em 258.

A igreja da época de Cipriano, caracterizada pela desunião, apegou-se às suas ideias. 

O bispo não poderia ter previsto as consequências dos meios pelos quais procurou manter a igreja unida. 

Na Idade Média, alguns homens incrivelmente gananciosos e imorais exerceriam o ofício de bispo, usando-o em benefício próprio, em vez de cuidar dos assuntos espirituais. 

A estrutura hierárquica que criou a “união”, também provocou uma enorme divisão entre o clero e os leigos. 

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.

C.156 O martírio de Policarpo


O dia estava quente. As autoridades de Esmirna procuravam Policarpo, o respeitado bispo da cidade. 

Elas já haviam levado outros cristãos à morte na arena. Agora, uma multidão exigia a morte do líder.

Policarpo saíra da cidade e se escondera na propriedade de alguns amigos, no interior. 

Quando os soldados entraram, ele fugiu para outra propriedade. 

Embora o idoso bispo não tivesse medo da morte e quisesse permanecer na cidade, seus amigos insistiram em que se escondesse, talvez com temor de que sua morte pudesse desmoralizar a igreja. 

Se esse era o caso, estavam completamente equivocados.

Quando os soldados alcançaram a primeira fazenda, torturaram um menino escravo para que revelasse o paradeiro de Policarpo. 

Assim, apressaram-se, bem armados, para prender o bispo. Embora tivesse tempo para escapar, Policarpo se recusou a agir assim. 

“Que a vontade de Deus seja feita”, decidiu. 

Em vez de fugir, deu as boas-vindas aos seus captores, ofereceu-lhes comida e pediu permissão para passar um momento sozinho em oração. 

Policarpo orou durante duas horas.

Alguns dos que ali estavam com a finalidade de prendê-lo pareciam arrependidos por prender um homem tão simpático. 

No caminho de volta a Esmirna, o chefe da guarda tentou argumentar com Policarpo: “Que problema há em dizer ‘César é senhor’ e acender incenso?”.

Policarpo calmamente disse que não faria isso.

As autoridades romanas desenvolveram a idéia de que o espírito (ou o “gênio”) do imperador (César) era divino. 

A maioria dos romanos, por causa de seu panteão, não tinha problema em prestar culto ao imperador, pois entendia a situação como questão de lealdade nacional. 

Porém, os cristãos sabiam que isso era idolatria.

Pelo fato de os cristãos se recusarem a adorar o imperador ou os outros deuses de Roma e adorar Cristo de maneira silenciosa e secreta em seus lares, a maioria das pessoas achava que eles não tinham fé. 

“Fora com os ateus!”, gritavam os habitantes de Esmirna, enquanto buscavam os cristãos para prendê-los. 

Como sabiam apenas que os cristãos não participavam dos muitos festivais pagãos e não ofereciam os sacrifícios comuns, a multidão atacava o grupo considerado ímpio e sem pátria.

Então, Policarpo entrou em uma arena cheia de pessoas enfurecidas. 

O pro cônsul romano parecia respeitar a idade do bispo. 

Como Pilatos, queria evitar uma cena horrível, se fosse possível. 

Se Policarpo apenas oferecesse um sacrifício, todos poderiam ir para casa.

-Respeito sua idade, velho homem — implorou o pro cônsul.

— Jure pela felicidade de César. Mude de idéia. Diga “Fora com os ateus!”.

O pro cônsul obviamente queria que Policarpo salvasse a vida ao separar-se daqueles “ateus”, os cristãos. 

Ele, porém, simplesmente olhou para a multidão zombadora, levantou a mão na direção deles e disse:

— Fora com os ateus!

O pro cônsul tentou outra vez:

— Faça o juramento e eu o libertarei. Amaldiçoe Cristo!

O bispo se manteve firme.

— Por 86 anos servi a Cristo, e ele nunca me fez qualquer mal. Como poderia blasfemar contra meu Rei, que me salvou?

A tradição diz que Policarpo estudou com o apóstolo João. 

Se isso foi realmente verdade, ele era, provavelmente, o último elo vivo com a igreja apostólica. 

Cerca de quarenta anos antes, quando Policarpo começou seu ministério como bispo, Inácio, um dos pais da igreja, escreveu a ele uma carta especial. 

Policarpo escreveu, de próprio punho, uma carta aos filipenses. 

Embora não seja especialmente brilhante e original, essa carta fala sobre as verdades que ele aprendeu com seus mestres. 

Policarpo não fazia exegese de textos do Antigo Testamento, como os estudiosos cristãos posteriores, mas citava os apóstolos e os outros líderes da igreja para exortar os filipenses.

Cerca de um ano antes do martírio, Policarpo foi a Roma para acertar algumas diferenças quanto à data da Páscoa com o bispo daquela cidade. 

Uma história diz que, nessa cidade, ele debateu com o herege Marcão, a quem chamava “o primogênito de Satanás”. 

Diz-se que diversos seguidores de Marcio se converteram com sua exposição dos ensinamentos apostólicos.

Este era o papel de Policarpo: ser uma testemunha fiel. 

Líderes posteriores apresentariam saídas criativas diante de situações em constante mutação, mas a era de Policarpo requeria apenas fidelidade. 

Ε ele foi fiel até a morte.

Na arena, a argumentação continuava entre o bispo e o pro cônsul. 

Em certo momento, Policarpo admoestou seu inquisidor: “Se você […] finge que não sabe quem sou, ouça bem: sou um cristão. 

Se você quer aprender sobre o cristianismo, separe um dia e me conceda uma audiência”. 

O pro cônsul ameaçou jogá-lo às feras.

Policarpo disse: “Pois chame-as. 

Se isto fosse uma mudança do mal para o bem, eu a consideraria, mas não posso admitir uma mudança do melhor para o pior”.

Ameaçado pelo fogo, Policarpo reagiu: “Seu fogo poderá queimar por uma hora, mas depois se extinguirá; mas o fogo do julgamento por vir é eterno”.

Por fim, anunciou-se que Policarpo não se retrataria. 

O povo de Esmirna gritou: “Este é o mestre da Ásia, o pai dos cristãos, o destruidor de nossos deuses, que ensina o povo a não sacrificar e a não adorar!”.

O pro cônsul ordenou que o bispo fosse queimado.

Policarpo foi amarrado a uma estaca, e o fogo foi ateado. 

Contudo, de acordo com testemunhas oculares, seu corpo não se consumia. 

Conforme o relato dessas testemunhas, ele “estava lá no meio, não como carne em chamas, mas como um pão sendo assado ou como o ouro e a prata sendo refinados em uma fornalha. 

Sentimos o suave aroma, semelhante ao de incenso, ou ao de outra especiaria preciosa”.

Quando um dos executores o perfurou com uma lança, o sangue que jorrou apagou o fogo.

Este relato foi repassado às congregações por todo o império. 

A igreja valorizou esses relatos e começou a celebrar a vida e a morte de seus mártires, chegando a coletar seus ossos e outras relíquias. 

Em 23 de fevereiro, todos os anos, comemoravam o “dia do nascimento” de Policarpo no Reino celestial.

Nos 150 anos seguintes, à medida que centenas de outros mártires caminharam fielmente para a morte, muitos foram fortalecidos pelos relatos do testemunho fiel do bispo de Esmirna.