quinta-feira, 14 de abril de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.

451 O Concilio de Calcedônia

Embora o Concilio de Nicéia tenha proclamado que Jesus era plenamente Deus, a igreja ainda precisava compreender sua natureza humana. 




De que maneira o humano e o divino se inter-relacionavam no Filho?

A resposta viria por meio de um dos mais exaltados jogos de poder da igreja.

Conforme a igreja crescia, as principais cidades do império recebiam influência teológica (e, por causa disso, seus arcebispos foram chamados patriarcas). 

Alexandria e Roma geralmente ficavam no mesmo lado das questões, opondo-se a Antioquia e Constantinopla. 

A combinação de política e teologia era algo especialmente poderoso.

A influência grega permeava os pensamentos da Escola Alexandrina. 

Muitas pessoas de Alexandria tinham um histórico filosófico de origem grega. 

Teológicamente, acreditavam que Jesus fora plenamente humano, mas eles tinham a tendência de enfatizar mais o Cristo como Palavra divina (Logos) que o Jesus humano. 

Quando essa questão era levada ao extremo, existia a tendência de obscurecer a humanidade de Jesus a favor de sua divindade. 

Apolinário, um dos principais defensores de Alexandria, lutara bravamente contra heresias como o arianismo e o maniqueísmo. 

Contudo, cometeu um deslize, equivocando ao afirmar que, na encarnação, o Logos divino substituíra a alma humana, de modo que a humanidade de Cristo fora apenas corpórea. 

Em 381, o Segundo Concilio Ecumênico condenou esse ensinamento.

A Escola de Antioquia apresentava a tendência de se concentrar na humanidade de Jesus. 

Embora Jesus fosse divino, eles diziam que sua humanidade fora completa e normal.

Ao envolver-se em uma disputa sobre a veneração de Maria, Nestó-rio, patriarca de Constantinopla, atacou a oposição de Apolinário. 

Para ele, a idéia de que Maria fora a “Portadora de Deus” era muito parecida com a idéia de Apolinário. 

Cirilo, patriarca de Alexandria, ansioso por abalar o poder de Constantinopla, acusou o patriarca de dizer que Jesus tinha duas naturezas distintas em seu corpo.

Em 431, no Terceiro Concilio Ecumênico em Éfeso, o maquinador Cirilo conseguiu que Nestório fosse deposto antes que ele e seus amigos pudessem chegar ao local das reuniões. 

Quando os clérigos ausentes chegaram, condenaram Cirilo e seus seguidores sob a liderança de João, o patriarca de Antioquia. 

O imperador Teodósio, que convocara o concilio, foi pressionado e terminou por exilar Nestório.

Adicione a essa situação volátil um clérigo que levava a ênfase alexandrina às últimas consequências. 

Eutíquio, chefe de um mosteiro próximo a Constantinopla, ensinava uma idéia que passou a ser chamada monofisismo (de mono, “um”, e physis, “natureza”). 

Esse ponto de vista sustentava que a natureza de Cristo estava perdida na divindade, “assim como uma gota d’água que cai no mar é absorvida por ele”.

O patriarca Flaviano de Constantinopla condenou Eutíquio por heresia, mas o patriarca Dióscoro, de Alexandria, o apoiou. 

A pedido de Dióscoro, Teodósio convocou outro concilio, que se reuniu em Éfeso, em 449. 

Esse concilio proclamou que Eutíquio não era herege, mas muitas igrejas consideraram esse concilio inválido. 

O papa Leão ι rotulou aquele encontro de “Sínodo de Ladrões” e, atualmente, ele não é considerado um concilio ecumênico válido.

Leão pediu ao imperador que convocasse outro concilio de modo que a igreja, como um todo, fosse representada. 

Esse concilio aconteceu na cidade de Calcedônia, próxima de Constantinopla, no ano de 451, atraindo cerca de quatrocentos bispos, frequência superior à de qualquer outro concilio já realizado até aqueles dias. 

Dióscoro sempre foi uma figura um tanto sinistra. 

Agora, nesse concilio, ele foi excomungado da igreja com resultado de suas ações no “Sínodo de Ladrões”.

Durante o Concilio de Calcedônia foi lida uma afirmação sobre a natureza de Cristo, chamada tomo [carta dogmática], de autoria do papa Leão i. 

Os bispos incorporaram seu ensinamento à declaração de fé que foi chamada de Definição de fé de Calcedônia, Nessa Definição de fé, Cristo “reconhecidamente tem duas naturezas, sem confusão, sem mudança, sem divisão, sem separação […] a propriedade característica de cada natureza é preservada e se reúne para formar uma pessoa”. 

Essa concepção condenava as ideias de Apolinário e Eustáquio, além das posições atribuídas a Nestório.

Calcedônia foi o primeiro concilio no qual o papa exerceu papel importante. 

Cada vez mais o foco da batalha seria entre Roma e Constantinopla. 

Calcedônia foi o último concilio que tanto o Ocidente quanto o Oriente consideraram oficial, com relação à definição dos ensinamentos corretos. 

Esse também foi o último em que todas as regiões foram representadas e conseguiram concordar em questões fundamentais.

Embora Calcedônia não tenha resolvido o problema de como Jesus era tanto Deus quanto homem, esse concilio estabeleceu limites ao definir como incorretas certas interpretações. 

O concilio, ao referir-se à posição adotada por Apolinário e Eustáquio, disse: “Qualquer que tenha sido a maneira como isso ocorreu, sabemos que não aconteceu dessa maneira”.

quarta-feira, 13 de abril de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.


432 Patrício é enviado como missionário à Irlanda

Um exescravo que nem mesmo nascera na Irlanda se tornaria a mais eficiente testemunha cristã naquele país. Patrício, filho de pais cristãos, nasceu na Bretanha romana por volta do ano 390. 




Embora nos primeiros anos esse menino não levasse fé tão a sério, começou a orar com fervor aos dezesseis anos, quando foi preso, escravizado e enviado para trabalhar como guardador de porcos em uma fazenda no norte da Irlanda. Para fugir de sua escravidão, Patrício viajou cerca de 320 quilômetros a pé rumo à costa. 

Ali, o capitão de um navio que transportava cachorros de caça concordou em levá-lo como tratador. 

Ele viajou para a França e, de lá, para um mosteiro no Mediterrâneo.

Quando voltou para sua terra natal, Patrício sonhou com as crianças irlandesas implorando para que ele levasse a elas o evangelho. 
“Imploramos que você venha e caminhe entre nós uma vez mais.” Como achava que não tinha a compreensão adequada da fé, Patrício voltou para a França a fim de estudar em um mosteiro. 

Por volta do ano 432, ele voltou à Irlanda.

Poucos anos antes, o monge britânico Paládio tentara converter os irlandeses, mas obtivera pouco sucesso. 

Os anos de escravidão de Patrício entre os irlandeses, aparentemente, o prepararam para ser um homem de coragem que compreendia aquele povo e sabia como pregar para eles.

A lenda obscurece muitos dados da vida de Patrício, mas a história de muitas vilas atesta seu ministério ali. 

Sabemos que o missionário converteu a maioria dos irlandeses ao cristianismo, estabelecendo cerca de 300 igrejas e batizando cerca de 120 mil pessoas. 

Embora Patrício enfrentasse problemas com alguns chefes de tribos hostis e com os druidas — os defensores do velho paganismo — “o povo comum o ouvia com alegria”. 

Não houve um mártir sequer no processo de conversão dos membros daquelas tribos contenciosas.

Usando a natureza, que já haviam adorado no passado, Patrício descreveu a Trindade comparando-a a um trevo. 

A compreensão dos irlandeses de que Patrício agia por Deus quando extirpou a falsa religião e estabeleceu a verdade entre o povo pode ser vista na lenda que diz que ele expulsou as cobras da Irlanda.

Depois de 30 anos de ministério altruísta, Patrício morreu por volta do ano 460. 

Ele nos deixou poucas coisas escritas, dentre as quais podemos destacar o notável hino I bind unto myself today [Hoje constrangido], conhecido como “Brasão de Patrício”.

Muitos anos depois, os missionários da igreja Ocidental chegaram à Irlanda e descobriram uma fé viva naquele lugar. 

Os sacerdotes e monges irlandeses eram estudiosos e missionários notáveis, e a igreja causara profundo efeito sobre as pessoas comuns. 

O clero vivia de maneira simples e devota, muitas vezes em circunstâncias difíceis. 

Embora seus mosteiros fossem despretensiosos, simples estruturas de pedra, o aprendizado e a arte (por exemplo, o extraordinário Livro de Kells) mostravam a piedade extremamente viva dos monges. 

O fato é que esse estilo de vida piedoso alcançou o restante da Europa à medida que levaram a Palavra para fora de seu país.

A igreja da Irlanda se desenvolveu à parte do sistema hierárquico de Roma, pois Patrício evangelizou a nação sem se basear na igreja oficial. 

A igreja irlandesa foi organizada ao redor de mosteiros, o que refletia o sistema tribal da nação. 

Sem o desejo de estabelecer uma burocracia eclesiástica, os abades irlandeses encorajaram seus monges a levar adiante o “verdadeiro negócio” da igreja: pregar, estudar e ministrar aos pobres.

A Irlanda só se tornou católica por volta do ano 1100, quando o papa deu a Henrique II, rei da Inglaterra, a soberania sobre a Irlanda. 

Em sinal de admiração pela maneira como Patrício trabalhara na conversão dos irlandeses, a Igreja Católica o canonizou.

sábado, 9 de abril de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.

1054 O cisma entre Oriente e Ocidente


As igrejas do Oriente e do Ocidente separaram-se no transcorrer de vários anos. 

O que um dia fora uma única igreja, paulatinamente se dividiu em duas identidades distintas.


Diferenças quanto a detalhes insignificantes ampliaram o conflito. O Oriente usava o grego, ao passo que o Ocidente utilizava o latim, graças à Vulgata e aos teólogos ocidentais que escreveram nessa língua. 

As formas de culto eram diferentes: o pão usado na comunhão, assim como a data para a Quaresma e a maneira pela qual a missa deveria ser celebrada eram também distintas. 

No Oriente, o clero podia se casar e usava barba. 

Os sacerdotes ocidentais não podiam se casar e apresentavam o rosto completamente barbeado.

As teologías eram diferentes. O Oriente se sentia desconfortável com a doutrina ocidental do purgatório. 

O Ocidente usava a palavra latina filíoque “e do Filho” no Credo niceno, depois de que a cláusula sobre o Espírito Santo estabeleceu que o Espírito “procede do Pai”. 

Para o Oriente, essa adição era heresia.

Diferenças que já existiam havia séculos explodiram devido a dois homens de temperamento obstinado. 

Em 1043, Miguel Cerulário tornou-se patriarca de Constantinopla. 

Em 1049, Leão IX tornou-se papa. Leão queria que Miguel — e, por meio dele, a igreja oriental — se submetesse a Roma. 

O papa enviou representantes a Constantinopla, mas Miguel se recusou a encontrar-se com eles. 

Desse modo, os representantes excomungaram Miguel em nome do papa. 
O patriarca respondeu fazendo o mesmo com os representantes do papa, excomungando-os.

Por meio de declarações recíprocas de que o outro não era verdadeiro cristão, os dois bispos criaram um cisma. 

Entretanto, não foram só eles que provocaram essa separação. 

As partes conflitantes tinham uma história de diferenças, que jazia na base desse desentendimento. 

O cisma foi o ato final que reconheceu essas distinções.

Como dizia o Credo, os dois lados acreditavam “na igreja una, santa, católica e apostólica”. 

Em 1089, o papa Urbano tentou fechar a ferida revogando a excomunhão do patriarca. 

Ele também promoveu a primeira Cruzada como meio de reunificar o Oriente e Ocidente, mas isso não deu certo.

Os séculos posteriores assistiram a tentativas de reunir as igrejas, mas nenhuma delas foi bem-sucedida. 

A curta “reunião” de 1204 aumentou a hostilidade. 

Em 1453, quando os turcos muçulmanos tomaram Constantinopla, alguns cristãos orientais afirmaram que preferiam os muçulmanos aos católicos. 

O cristianismo unido parecia impossível.

Embora a diferença entre as duas igrejas possa parecer algo que não se relaciona totalmente com o que é essencial, no coração da disputa estava a questão do poder. 

Em uma época que via a autoridade dos bispos como chave para a estabilidade da igreja, não poderia haver duas pessoas reivindicando a mesma autoridade. 

Por não chegarem a um acordo, o Oriente e o Ocidente começaram a trilhar caminhos separados.

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Acontecimentos mais importantes da história do Cristianismo.

988 Conversão de Vladimir, príncipe da Rússia

A conversão de um governante pagão, amante do divertimento, efetivamente levou o cristianismo à Rússia. 

Embora o cristianismo já tivesse alcançado a Rússia na primeira parte do século X, não foi aceito de maneira geral. 
Em 957, Olga, a princesa viúva de Kiev, foi batizada. 

Ela pediu a Oto I o rei germânico, que enviasse missionários a seu país, mas eles provavelmente tiveram pouco sucesso, pois a religião paga prevaleceu.

Vladimir, neto de Olga, estava entre aqueles pagãos. 

Ele construiu diversos templos, atraindo fama para si mesmo em função de sua crueldade e de sua falta de lealdade. 

Ele tinha oitocentas concubinas e cinco esposas e, quando não estava lutando em alguma guerra, caçava e festejava. 

Ninguém o escolheria como o homem que levaria o cristianismo ao seu povo.

Como a maioria dos governantes, Vladimir queria manter seu povo alegre. 

Ele percebeu que poderia fazer isso unificando-os pela religião. 

Desse modo, conta-se que enviou diversos homens para examinar as principais religiões. 

Com suas regras de alimentação restritivas, nem o islã nem o judaísmo agradaram ao príncipe, de modo que ele teve de escolher entre o cristianismo romano e a igreja do Oriente.

Depois de comparecer a um culto na Igreja da Santa Verdade, em Cons-tantinopla, os homens de Vladimir apresentaram o seguinte relato: “Não sabíamos se estávamos no céu ou na terra, pois certamente não existe tamanho esplendor ou beleza em qualquer lugar aqui na terra. 

Não somos capazes de descrever o que vimos. 

Sabemos apenas que Deus habita entre aqueles homens e que seu culto ultrapassa em muito a adoração de todos os outros lugares. 

É impossível esquecer aquela beleza”.

De acordo com a história, devido a essa beleza, Vladimir optou pela ortodoxia. 

É verdade que essa era a religião da nação vizinha, mais poderosa, rica e civilizada: o Império Bizantino. 

Quando a irmã do imperador bizantino, Basilio, foi-lhe oferecida em casamento, Vladimir aceitou, o que ajudou ainda mais a consolidar sua posição junto ao vizinho.

Em 988, Vladimir foi batizado e, um ano depois, casou-se com Ana, mas nenhuma das duas atitudes foi uma mostra de que ele estava se submetendo ao Império Bizantino.

A escolha de Vladimir deixa claro que a igreja russa se concentrava no culto de adoração. 

A ortodoxia oriental sempre teve um apelo estético. 

O nome da religião escolhida pelo príncipe, pravoslavie, significava “verdadeira adoração” ou “a glória apropriada”. Para a mente russa, o cristianismo significa liturgia.

Depois do batismo de Vladimir, sem muitas dificuldades, o povo colocou de lado as velhas religiões. 

Embora a Rússia não tenha se tornado uma nação cristã da noite para o dia, as coisas começaram a mudar. 

Em um primeiro momento, as conversões em massa não aconteceram, mas, com a ajuda dos monges — sempre uma força de primeira grandeza na ortodoxia oriental —, a nova religião começou a fazer com que sua influência fosse sentida.

Graças a Metódio e Cirilo, a Rússia tinha uma liturgia cristã em sua própria língua (o idioma eslavônico). 

As pessoas podiam participar e entender maravilhosa liturgia nas belíssimas igrejas construídas por Vladimir e seus sucessores.

A conversão de Vladimir claramente influenciou seu estilo de vida. 

Ao se casar com Ana, deixou as outras cinco esposas. 

Destruiu também os ídolos, protegeu os oprimidos, criou escolas e igrejas e viveu em paz com as nações vizinhas. 

Em seu leito de morte, doou todas as suas posses aos pobres. 

A igreja grega terminou por canonizá-lo.